2023/11/30

...sol de volta aos seus olhos

 


Sabia estar no fim da vida,

O tempo passava com a vagareza que nunca tinha conhecido,

O corpo encolhia como uma esponja que se torce,

E havia cada vez mais espaço entre as palavras e os sussurros que libertava,

Mas ainda assim recusou a subjugação,...


Recebeu forças da memória,

Da casa que já foi cheia e agora a amedronta de solidão,

Do amor vitorioso de todos os dias da sua vida,

E gritou,

Avisou o mundo,

Os ainda vivos e os que a tinham amado e já só a viam por trás do silêncio,

Que era ainda uma pessoa,

Merecia respeito,

E queria sol de volta aos seus olhos

2023/11/29

Aliviar o choro

 


Ninguém lhe perguntava se era feliz,

Tinha-se limitado a regressar ao sítio onde o tempo era pesado,

Em que os sorrisos pareciam coisas dos filmes americanos,

De que toda a gente desconfiava,...


E as pessoas se confirmavam a elas próprias,

Sem espaço para recursos de sentimentos,

Ou frases feitas de amor,...


Parecia-lhe bem que assim acontecesse,

Ao menos conseguia todos os dias aliviar o choro,

Que trazia apertado na garganta,

E ao faze-lo de noite,

Quando só a espera dos velhos pela morte se ouvia,

Deixava-o conformado,

Expectante do novo e colorido amanhecer 

2023/11/28

Silenciavam o sentir

 


Ela foi a mais nova impressão de sonho que por ali passou,

Os seus cabelos eram simples,

Brilhavam incandescentes ao sol,

E recolhiam-se em casulo ao entardecer,

Tinha um sorriso naturalista,

Repleto de cores e ao mesmo tempo opaco e sensivel,...


As pessoas silenciavam o sentir perante ela,

Mas mostravam ilusão no olhar,

Um conforto amoroso quase,...


Ela fazia por ignorar a felicidade racionalista de perceber tudo isso,

Mas guardava-o por dentro de si,

Contra as paredes de si mesma

2023/11/27

Exercício de envelhecimento

 

Terminal de autocarros de Ljubiliana, Eslovénia 
26-6-2023

Cheguei a velho, e ninguém me tinha ensinado a lidar com isso. Eram manhãs diferentes, com uma diferença insinuante, que batia à porta quase como se quisesse entregar uma encomenda de um familiar distante, e depois nos entrava pelos poros, numa dor excruciante e que humilhava. As frases saíam a medo. O cérebro dava mostras de desligar muito devagar, e afogueava todos os sentidos, numa clara sensação de não retorno.  Eu consigo ainda perceber quando essa noção clara de fatalidade chegou.  Tenho 62 anos conformados. O meu corpo falha, mas falha subtilmente.  Mostrando que é ele quem manda, e que eu nunca poderei fazer nada para evitar essa fatalidade.  A minha vista esmiuça-se como bagos de arroz. O som da vida chega-me por um túnel que se vai estreitando cada vez mais, a ponto de acordar sem me reconhecer a mim próprio.  A memória, bem, essa sinto-a como um caleidoscópio sem sentido, e com cores que nem sequer consigo dominar. Era um inicio de manhã de Inverno, e procurava sapatos decentes para calçar. A minha casa tem uma divisão única para estes acessórios, e cada par tinha até aqui uma história diferente para contar. Tinha apreendida a data, o contexto, a verdade com que tinha comprado cada um deles. E, de repente, isso parece ter sido a primeira coisa que deixei de controlar. Depois veio a necessidade de cumprir horários.  Considerava-me um fanático da rotina, com horas meticulosamente definidas para cada parte do dia. E esse desejo esvaiu-se a seguir. Passei a arrastar-me da cama de manhã. Não tinha objetivos porque escolhia deixar de os ter.  A uma solidão auto assumida, tinha aprendido a responder com designios fortes de vida.  Perceber o mundo em que vivia, dominando assuntos que eu próprio escolhia.  Fazer-me ver junto dos edifícios dos órgãos de soberania que tinha aprendido a respeitar. E principalmente, acima de qualquer outra coisa, não ser mais um na maré de anulação que matizava os dias. E agora escrevo a forma como isso me está a ser retirado.  De uma forma vil e metafórica. Não ter já quem nos salve de uma fatalidade como esta, é mais doloroso que inacreditável. 

2023/11/26

17 anos:-(

Inatingiveis 2023: 16 anos:  Acocorado, Uma palavra que gosto, E assim estou à espera que do dia, Nasçam pequenas diferenças no jogo da evolução,... Imagino filhos de u...

Sangrar

 


....deixei de ser eu quando o tempo saltou por cima de mim, relinchou como se fosse um boi na tourada mais próxima, e nunca mais ninguém o viu. Lembro-me dos desejos de miúdo por fazer, com espírito de trazer por casa. O mesmo que se divertia a tocar a campainhas, era o que agora pensava por onde tinha. Por onde queria ir. Por onde teria de deixar de caminhar, para que o zé, o manel, o não sei quantos, o cara cagada, e os outros que já cá não andavam, se pudessem, quem sabe, orgulhar de mim. Eu cheguei a dar nas vistas. Era um miúdo que se pode dizer dotado. Punha os pontos nos is, acabava as frases com entoação, e achava na música o que sabia que a maioria não era capaz de encontrar. Mas depois perdi-me,
o tempo passou-me por cima, e agora não sei onde anda. Sou o mesmo de sempre, mas aparado nas pontas. Não me consigo reparar...

2023/11/25

Saco cheio de desejo

 


Era pouca coisa,

Um saco cheio de desejo,

Umas calças andrajosas, de cor inofensiva, desatualizadas,

A vontade despropositada de mudar,

E ainda lápis quase gastos,

Vários de tamanhos diferentes,

Espalhados irregularmente por sobre a mesa de todos os dias,....


Não sabia o que fazer com o que me havia sido oferecido,

E estava sentado,

De cotovelos ligeiramente apoiados,

E o queixo disposto em postura reflexiva,...


Era mais um beco sem saída na minha vida

2023/11/24

Ouço esta música e sinto-me com cinco anos de novo....

 


a priori,...lugar

 


vou chamar lugar,
o que subtrai,
soma sem refletir,
as circunstâncias de um erro,
o sorriso sem preço
de um amor que sempre será,.....

tudo é lugar,
desde que não exista,
não tenha preço,
não custe mais que uma virtude,
um elogio fora do lugar,
não custe sem gestos desligados e desvirtuados,....

chamo de lugar,
com letra irregular,
trémula,
própria de uma pessoa com defeitos,...

e que no final do tempo,
inche tanto,
tanto,
que se saiba que rebentará,...

quando já estivermos,
onde possamos chamar outra vez,
lugar

2023/11/23

Canção sem forma e cor

 


A ferida envolve-me o braço,

Num percurso irregular e profundo,

Que me devassa a pele,...


Percorro a distância entre a sanidade e o desejo,

E acumulo um rasto irregular de sangue,...


Lá de fora um cheiro infinito a vontade,

Invade o meu mundo,

Com gritos lancinantes de pássaros,

Ainda a resistir ao silêncio envolvente da noite,

Que vai a chegar,

Numa canção sem forma e cor

2023/11/22

Atemorizada pelo desprezo


 Era interessada por natureza,

Esforçava-se por rir, ouvir, perceber,...
Retorquir quando preciso,
Adotar o silêncio quando o bom senso mandava,
Ansiosa e mutante,
Adaptava-se ao meio,
Mais do que o inverso,...

Isso saia-lhe da pele,
Como um réptil que pratica o mimetismo,...

E assim continuava,
Receosa do tempo,
Inimiga da morte,
Atemorizada pelo desprezo

2023/11/21

Um dia gostava de saber escrever assim

 

Mary Jo Bang

poetisa norte-americana

Hipotálamo



 Sentia a memória fechada,

Com quatro barulhos secos e violentos,
Semelhantes à ativação de uma fechadura,
Que jurou ter ouvido a polvilhar o hipotálamo,...

Era certo que a vida mudaria,
Os sentidos adaptar-se-iam,
Os membros deixariam de responder à rotina,
Até o onirico ganharia novas formas,...

Viesse o que viesse,
Seria bem vindo,
Era uma fase da vida por descobrir 

2023/11/20

Citava filósofos

                                                                            Tirado daqui
Obra original de Frank Zappa


Foi da presença de um estranho,
Recordo-me que citava filosofos,
E genericamente dizia-se feliz por haver uma alegoria da caverna,
Foi dele que se sobrepôs a razão,
Em vez da virtude,....

Não me recordo da sua aparência,
Mas também não conta para o momento,
Só sei que reforcei a construção que já tinha do determinismo,...

Tudo para mim,
Até a forma exponencial como o corpo me dói,
Depende do ângulo raso que o sol faz ao nascer

2023/11/19

Linguagem não verbal

 


Sentou-se junto à avó enquanto ela tricotava. Era um hábito antigo, do qual não estava disposto a abdicar. É que gostava tanto daquela criatura, de uma forma intrinseca, sincera, até devota, que tinha conseguido desenvolver um sistema de comunicação não verbal com ela. Um sim era o que todos sabem, um menear de cabeça. Um não, abanar o pescoço servia. Polvilhar aqueles minutos pardacentos e que passavam devagar com muitos amo-te, era conseguido com abrires e fechares de olhos. Até conselhos se conseguiam pedir sem falar.  Quando ele estava mal de amores, a avó percebia. Era hábito sentar-se no chão, de pernas cruzadas, a olhar para o chão com o queixo apoiado nos nós dos dedos, que fechava como se rezasse. A avó punha-lhe a mão na cabeça se achasse que era hora de mudar, seguir em frente. Se continuasse a dar pontos atrás de pontos, sem sequer reparar nele, é porque a rutura ainda não era para chegar.  Ele achava que a pessoa mais importante da sua vida, que tinha ali junto de si, tinha desistido de falar. Mas não desistido da vida.  As agulhas de tricot eram como os ramos de árvore a que ela se agarrava, com toda a força, recusando desligar-se da vida. E isso alegrava-o. Fazia-o sentir completo, recusando-se por enquanto a pensar no dia em que chegaria aquela casa que era a casa do seu ser, do seu coração, para ver que aquele ser frágil, mas não derrotado, tinha desistido de fazer tudo aquilo. No dia em que isso viesse, a sua vida mudaria. Até lá, era aquilo.  Um doce e pachorrento convívio com o tempo, e deslindar de amor

2023/11/18

Boa (e húmida) tarde


 

Espirrar sangue

 


Não te dou fruta,

Antes de mim terás carne,

Encarniçada e a espirrar sangue,

Uma pulsão de vida e nunca,

Em momento algum,

Um sinal adulterado de pecado,

Que consigo sempre ler como um livro,...


De mim terás o que sou,

Isto que te disse,

E não um assombro falso de mediania

2023/11/17

Sonho grego



 O som da rebética afunilou-se pela minha cabeça dentro,

Estávamos com a acropole ao lado,

Os dois enevoados pelo calor da velha Atenas,...


O tempo custava a passar,

Culpa da música inconsequente que nos rodeava,

Por entre os espaços que os insetos deixavam,...


Achou-se a bissetriz do silêncio,

Apesar de tudo,

E pude dizer-te o que queria,

Um amor de mãos sujas com açúcar,

E medo sufocante de ausência 

2023/11/16

A vulso

vamos descobrir-nos,
há um montinho de desejo em pó,
espalhado pela casa,...

passos certos,
sem rumo,
deixam-no capaz de ganhar
corpo,
andar,
e deitar-se entre os
nossos corpos apagados


                                                                                Tirado daqui

Terras longínquas

 


Sim eles quase descobriram o amor,

O horizonte é limitado,

A virtude já não estava em cima da mesa como até aqui,

Os miúdos só conseguiam pontapear bolas cor de carne,

Em silêncio,

Enquanto os adultos rodeavam uma praça envelhecida de centro de cidade,

A falar sobre tudo e coisa nenhuma,...


Tinha-se chegado a nomear terras longínquas,

Onde a virtude existia,

E as pessoas até davam as mãos para deixar escorrer sentimentos entre elas,

Mas nunca chegou,

O amor parecia ter passado ao largo daquele sítio 


2023/11/15

Loucura coartada

 


Fez-me mal ler um livro de memórias,

Tão sangrento,

Visceral até,

Uma escrita da carne e para a carne,

Alongada no tempo mas recolhida no espaço,...


Foram de transpirar notivagas dissertações do autor sobre a luz,

A loucura coartada em raios esporadicos de vingança,

Que invadiam uma pequena casa, 

Por todas as entradas possíveis,...


Um livro de memórias delicioso,

Mas nocivo

Escrevia fados

 


O meu tio fazia isso de escrever fados,

Era uma segurança e um escape para ele,

Um pequeno bloco servia,

Já envelhecido,...


Com uma caligrafia de esmero,

O homem refugiava-se em amores impossíveis,

Histórias de devoção com muito mar pelo meio,

Desenhava na frugalidade da imaginação homens de trabalho,

De espírito tosco mas respeito à tradição,...


O meu tio nunca me mostrou o seu bloco dos fados,

Agora já não o tenho para confirmar o que sempre supus 

2023/11/14

Paredes das ruas

 


Nestas primeiras horas a vista ainda me pesa,

Os braços como que apodrecem,

Corrompidos pela digestão errada do que a cidade nos faz ä memória,...


Soluções para tudo não existem,

É o que me ocorre ao lambuzar-me pelas paredes das ruas,

E virtudes retiradas de autores que nunca lemos,

Também não,...


Vou fazer o qus sempre faço,

Quando estou indeciso,

Afasto-me do contador das lágrimas,

Fazendo questão que tudo o que faça e diga,

Cesse de alguma vez ter sentido

2023/11/13

Ditava desgraças

 


Sonho com as estrelas e elas rejeitam-me,

Falam de um cisma religioso contra mim,

E esbracejam,

Anulam anátemas,

Desfazem ilusões,

Tudo está perdido e ninguém poderá resolver o que se perde,...


O homem ditava desgraças,

Tomava nota de datas,

Sentado na mesa de canto do café,

Olhava nos olhos quem passava,

E marcava para breve o fim do mundo,...


As pessoas teriam de se salvar, 

Confiando-lhe os desejos,

Sem retorno possível 

2023/11/12

Submeter-me

 


se terminar,
as palavras seduzir-me-ão,
haverá luz suficiente para novos dias,
novas folhas descontroladas de
razão,....

a verdade virá em colheres
de prata,
sons dourados,
velas tremeluzentes que morrem
com elas próprias,...

 se teminar,
a virtude será minha,
e uma passagem da Bíblia,
Novo Testamento,
porá termo ao tempo conforme o conhecemos

2023/11/11

Insubmissão do dia

 

Imagina um homem sentado na brancura de um pátio,

Escorre luz pelas paredes,

Ele admira a insubmissao do dia,

Aproveita o espaço para dispor prioridades,...


O homem sente-se como um braço de rio,

Que se perde anónimo pela insignificância do espaço,

Uma pedra de sol acaba o impasse

2023/11/10

Num prédio



A subida faz-se morosa. As escadas tremem aos pés de um padre sem confiança. Pára em frente à porta de casa, tira chaves que tilintam com os tremores nervosos, e entra. Chove. Uma irresponsável entra no prédio, visivelmente afetada pelo súbito mau tempo. Bate os pés várias vezes, enquanto maldiz a sorte, o que lhe resta do dia, não ter correspondência nos devaneios amorosos que experimenta diariamente,...
Numa mão segura dois sacos com compras, na outra uma flor desmaiada que não se lembra como ali foi parar. Entra em casa, parecendo-lhe ouvir uma música que não percebe de onde vem.
No último andar um menino sai de casa. Vem alegre, pois transporta uma caixa redonda com pedras luzidias e raras, que jurou guardar até ser adulto e começar a trabalhar como geologo. Desce as escadas sorridente, sem reparar que quase vai chocar de frente com a moradora mais velha daquele prédio, que ele nem sequer conhece. 

2023/11/09

Pombas de más virtudes

 


Trazes noticias,

O teu caminho de onde eu nunca estive foi direto,

Sem pombas de más virtudes, ....


Trazes notícias de frases soltas,

Por quem esperas assim,

De cabelo solto,

Passos incertos e remendados no chão,...


Pensa em epiciclos,

As noticias que trazes, 

Caberão na curva da noite,

Que se precipita no torpor do dia 

2023/11/08

Viagem imaginada

 


À partida este seria um caminho fácil de percorrer. Um tosco retângulo de terreno com mais ou menos um quilómetro de diâmetro, e uma estrada ziguezagueante, aos altos e baixos, mas em relativo bom estado, que a atravessava na diagonal. Há praias no inicio, e penso que no fim também haverá. A ideia é parar lá, debaixo dos tamarindos velhos mas frondosos, e ganhar balanço para chegarmos ao outro lado. Acho que no inicio e fim da viagem as paisagens serão parecidas. Curtas extensões de areia, que deixam os pés a vermelhar de salsugem, por entre o tímido impeto de ondas que chegam para nos lamber os pés, e depois regressam prontas a voltar e fazer o mesmo a quem se atrever a passar depois de nós. 

Pressinto o teu hábito de apreciar experiências destas de forma indolente, escolhendo locais ao acaso para te deitares, se possivel nua, amantizada com o bater do coração da terra por baixo do teu corpo insinuante. Pressinto e desejo. Gosto de locais excessivos, para que o excessivo do que temos sobressaia

2023/11/07

A despedida foi dolorosa

 


Tinha um relógio 

De corda. Dos antigos, que me tinha custado qualquer coisa que já nem me lembro.

E ele tinha o hábito curioso de parar sempre que te encontrava.

Punha músicas diferentes a tocar no rádio do carro. Dava à manivela para cima e para baixo para que, pelo menos num sentido figurado,

Te pudesse prender, e às tuas hesitações, e aos teus desejos perdidos, de forma a que o relógio,

Pudesse funcionar normalmente.

Mas ele insistia em parar sempre quando tu estavas perto.

Fomos dormindo pela cidade,

Em espaços que não vinham no mapa, repletos de sons pequeninos, e de sonos que apreciavamos muito,

Mas o problema continuava igual. A ponto de perdermos ambos a noção de tempo. E a solução encontrada foi única,

E comum.

Íamos emigrar um do outro. Pegar nos nossos corpos, nos parcos haveres que havíamos juntado neste epicurismo puro que tínhamos vivido,

E partir.

A despedida foi dolorosa. O teu corpo fechou-se ao meu toque. E soube que nunca mais irias ser minha da mesma forma

2023/11/06

Um dia gostava de saber escrever assim

 Não darei o teu nome


“ Não darei o teu nome à minha sede
de possuir os céus azuis sem fim,
Nem à vertigem súbita em que morro
Quando o vento da noite me atravessa.

Não darei o teu nome à limpidez
De certas horas puras que perdi,
Nem às imagens de oiro que imagino,
Nem a nenhuma coisa que sonhei.

Pois tudo isso é só a minha vida,
Exalação da terra, flor da terra,
Fruto pesado, leite e sabor.

Mesmo no azul extremo da distância,
Lá onde as cores todas se dissolvem,
O que me chama é só a minha vida.”

David M. Ferreira

E os dedos doem-me

 

Tudo o que for apresentado,

A loiça,

O desejo de partir,

Roupa de um passado enublado e que envergonha,

Tudo será queimado,

E as cinzas espalhadas no caminho ímpio da falta de virtude,...


Tudo o que for apresentado,

Está neste poema,

E os dedos doem-me,

Porque a verdade não é esta,

É outra que não conheço 

2023/11/05

Traduzido e arrependido

 


Como devem ser os que guardam ossos,

Quem ao relento deixa a pele retalhar ao vento,

Como devem ser os desesperados,

Quem se arrepia debaixo do sol solitário,...


Como deve ser o dinheiro que paga a partida para longe,

Para a família exposta ao suor,

Às desilusões,...


Como devem ser os poucos pontos,

De um conto que ainda tenho por acabar,...


Como deve ser o prazer,

Traduzido e arrependido,

Na tua pele

2023/11/04

Papelinho gasto e inocente

 


Vivemos distantes de nós!,

O fingimento assim não se esconde,

Vai-se adiando como aquele amor que se vê ao longe,

Muito ao longe num horizonte de madrugada,

E se sabe que vai acabar por nos tocar,...


Parecia premonição a forma como te escreveste,

Toscamente,

Num papelinho gasto e inocente,...


E depois saíste para qualquer lugar sem nome,

Parecia premonição para as palavras que agora,

Me estão travadas acintosamente na boca

2023/11/03

O dia mais feliz da minha vida

 


3,4 pingos de saliva

 


Ela escondia-se por trás de olhos apagados,

E dava erros ortográficos propositados,

Escrevia amor com 3, 4 pingos de saliva,

E morte com uma desonra de sangue que precipitava da impressão digital,...


Por vezes ela nem nome sentia ter,

Idade sim,

Muita,

Apesar de ser ainda a acólita do próprio corpo,

Numa Eucaristia de toques onanistas,...


Ela era assim,

Nitidamente desapegada

2023/11/02

Em repeat

 


Gosto acre

 


Era um gosto acre,

Apodrecido até,

Que nem um contorno demorado pelos braços,

Com uma paragem em seios pequenos mas firmes,

Parecia atenuar,....


Um gosto de carne,

Apagada da vida,

Que queimava à vista coletiva,

E desiludia,...


Mais do que um rosto ensanguentado,

Uma moratória sobre a morte,

Servia até para assustar,...


Apetecia esgotar o receio do novo,

E esperar que do ar surgissem novos desafios

2023/11/01

Novembrando a 10 de junho

 


Escritores russos em barda,

Um desejo interminável de literatura de estepes,

Enquanto o chão rangia,

A água para o chá ganhava vida e corpo próprios,

O trânsito na rádio se imiscuia pelas paredes,...



As mães desesperadas de tolstoi,

O medo preso de soljenitsine,

Tanto verbo gasto por ribakov,

Escritores russos juntos abrem a porta de casa,

E apontam a vida lá fora

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