2024/03/19

Triptico do medo


Apocalypse Now
Realizador: Francis Ford Coppola (1979)

Talvez o medo,
As possibilidades toscas de resolver a situação,
Agravando-a a ponto de não retorno,.. 

Brincar com a transgressão,
Com o problema do pavor contido,
E incapaz de se revelar,...

Este triptico como forma de o resolver,
Insipiente,
Auto desvalorizado,...

Escondido pela pobreza de conteúdos,
A que se impõe,
E de que não se liberta,...

O medo vendido como,
Remédio indestrutível,
E que falha sempre 

2024/03/18

Viver a desrespeitar

Viver,
Viver o sol,
As fases abstratas da vida,...

Viver de gato na mão quando o corpo pede solidão,
Viver como aminoácido,
A processar razões para entender o caminho que se desdobra,...

Viver a desrespeitar frases feitas,
Virgulas fora do sítio,
E entoaçôes falsas,
Como carne de sabor adulterado,...

Viver sem pedir as licenças que,
Se exigem,
Num texto que se quer,..

Sem fim 

                                                                    Tirado daqui
 

2024/03/17

Acabei de comer bolo de aniversário....

 

Fyodor Dostoyevsky, Uma criatura gentil

Linhas firmes



A todos os medos,
Os passos em falso para o passado,
A tudo o que não luz como uma ferida purulenta,
Chamamos evolução,...

A música explica-nos como mudar,
O silêncio como fazer mal,
Há lugares que não se sentem,
E quando assim é resta-nos dormir,
Esperar por lições do corpo apagado,...

E faz toda a diferença esperar,
Que a paixão mude tudo isto,
E o faça com linhas firmes,
Reduções de amor dentro do que se espera para amanhã,
Que nunca vai chegar 

2024/03/16

O senhor Ayoama

A casa do senhor Ayoama falava por si própria. Dizem que sim, pelo menos. Eu concordo, só de a observar de longe, enquanto espero que o sol baixe na rua contígua.
É uma construção antiga, com balaustrada íngreme e a aparentar instabilidade. Quase parece que a tragédia pode estar iminente. Tem janelas de tamanhos diferentes, todas com portadas e cortinados velhos e amarelecidos pelo tempo e a poluição da rua movimentada. O senhor Ayoama raramente se deixa mostrar. É uma figura preponderante da tradição japonesa que a minha rua sempre teve. Tinha chegado ali há uns 30, 40 anos, com o pretexto de abrir um negócio de quiropatia. Foi ficando, casou-se com duas mulheres que, segundo se diz, o deixaram por se terem consumido numa tristeza de razões que nunca foram realmente percebidas pelas pessoas.
O senhor Ayoama tinha raízes desconhecidas. Andava agora pelos 80 anos,
apesar de a aparência o levar para pouco mais de 60. Todos o cumprimentavam quando, manhã cedo, saía de casa para um passeio ao centro da cidade. Usava um chapéu de feltro, um sobretudo acastanhado a que aparentava ter um grande amor. Calças de tweed, e sapatos de bico fino, que lhe dificultavam um pouco a locomoção.
 Mas nem isso lhe tirava uma boa disposição que todos apreciavam. Após alguns minutos na rua, voltava a casa com um saco parco de compras. Mercearias para abastecer a casa, e flores. Todos os días flores, que usava com frequência para embelezar os parapeitos da janela de casa.
Outra atividade que se reconhecia ao senhor Ayoama era a pintura. Em especial quando o tempo aquecia. A meio da tarde, quando a brisa vinda da foz do rio lhe entrava pela casa dentro, envolvendo-se numa dança virginal com os cortinados envelhecidos, o idoso japonés era visto concentrado em frente a uma tela. Do exterior era impossível perceber o que pintava. Apenas que a arte lhe proporcionava alegría. Um sorriso insólito e permanente, que podía observar, e me deixava também feliz.
Um dia, o senhor Ayoama pareceu ter-se fartado do que tinha sido a sua vida das últimas décadas. As pessoas começaram a ver várias carrinhas paradas à porta de casa, com estafetas empenhados em carregar os parcos haveres do respeitoso oriental. Até que uma jovem de pele alva, olhos rasgados, e total discrição, surgiu em frente ao prédio. Pressionou a campainha que dizia respeito à casa do senhor Ayoama, este surgiu à janela sorridente, e mandou-a subir.
Por algum tempo, dedicado ao meu passatempo dos inícios de tarde de há muito, vi-os parados na janela da divisão de casa onde normalmente o senhor Ayoama pintava. Falavam, sem que percebesse sobre o quê. Ocasionalmente, ele punha-lhe a mão nos ombros, e abanava-a muito levemente. Talvez um aspeto do relacionamento pessoal oriental que desconheço. E fazia frio, uma súbita descida de temperatura naquele canto caldo do mundo, quando o senhor Ayoama saiu pela última vez do prédio onde tinha morado por tanto tempo. Veio acompanhado pela sua jovem e desconhecida amiga, Segurava uma mala de xadrez, com um pedaço de tecido, quase mínimo, a pender do fecho. Ela trazia dois vasos com flores. Quando chegaram à rua, olharam ambos para cima. Os primeiros pingos de chuva surgiram, e selaram a despedida do que foi um raio de sol que abraçou aquele canto do mundo. O senhor Ayoama. Desconheço onde possa andar agora.


Tirado daqui

2024/03/15

Um dia o mundo acaba em declive


Contos do Congo, Mbomo
República do Congo, 
Fotografia de Pieter Henket, 
2018. 

o ar,
a terra sem pássaros,
árvores de morte
espalhadas sem critério,...

 um caminhar pesado,
que se arrasta,
o mundo acaba em declive,
e o homem sorri,...

 desenha no ar as ideias
fortes de uma vida,
e o chapéu,
e a roupa que quer,....

chove,
a carne consome-se
em dor,
e o homem mantém-se,
erguido,
enquanto lê
o que o planeta escreve,
em fogo

2024/03/14

We don´t care about us

 


o meu amor tem dois
lados,
a vergonha é uma
cara,
o desespero a outra,....

o meu amor pesa arrobas,
tem o mundo todo
dentro do sorriso,
e o desejo esgotado pelo fogo,...

o meu amor
está na chama
que desvanece,
foge da chuva,
tem pés de alento,
e corpo de incúria,...

o meu amor somos nós,
eu e tu como balões,
que só param onde
este mundo acabar,
e aí num raio de luz,
faremos de nós
um amor que foi,
e talvez continue,
para sempre a ser

2024/03/13

Insinuante e erótico

 Finalmente o medo,

De todas as saídas possíveis,

Prefiro as formas desconhecidas,

O peso inocente e reconhecido da falta de virtude,...


O medo que chega sempre desacompanhado,

De roupas soltas,

Lábios deformados,

Insinuante e erótico nos atos,...


Por isso até o tolero,

Sentado imóvel à mercê do vento que,

Anuncia o inverno,

Permito que ele venha para ficar

2024/03/12

Formas geométricas invisíveis de ti

 Mentimos e as veias pulsam,

Há um caminho para ti que os jornais anunciam,

E o vento sopra de mim,...


Não tenho pele para a solidão,

Havia formas de desleixo,

Que só existem em mim na roupa que espalho para trás,

Nos sustos do gato quando fecho a porta para sair,

No teu cheiro,...


Há formas geométricas invisiveis de ti,

Que dormem comigo,

Fogem comigo,

E encimam esta amálgama de confusão,

Em que me vejo transformado

                                                                            Tirado daqui

2024/03/11

Eyes wide shut

comi, pedi um café. olhei nos meus próprios olhos, como se isso fosse possível. era capaz, de pálpebras coladas. uma habilidade que vinha de criança, quando queria voar, e as paredes brancas amarelecidas do meu quarto, que cheiravam sempre a qualquer coisa a apodrecer, funcionavam como prisão difícil de descrever. e naquele dia, vi o meu próprio arrependimento. desenhava corações numa areia suja. era uma praia, de um dia qualquer de final de Verão._um vento de letras grandes soprava, e afastava os resistentes daquele anfiteatro a céu aberto. a minha vontade, as pessoas que tinha conhecido até aí, os choros de madrugada que ninguém ouviu mas que os que me conheciam sempre perceberam, estavam ali. a morrer na espuma das ondas. reabri os olhos. Um indigente, de repugnância bem desenhada na barba, admirava-me como qualquer coisa de novo na sua rotina. Levantei-me, fui para um canto. Voltei a olhar para os meus próprios olhos, a pesar de sentir a luz a esmorecer como uma criatura que hiberna no inverno. e lá me encontrava. como o homem das letras minúsculas nos inícios de cada frase.que não suportava nem ventos, nem resplandecências mal definidas do sol que reaparece sempre por entre as nuvens carcereiras. o café ia fechar. Paguei, levantei-me, e saí. Tinha uma conta a pagar, antes de voltar ao reinício de tudo o que sempre me acontecia.






                                                                            Tirado daqui

2024/03/10

O que de pior, o real tem

como somos os que aceitamos
desfigurações,
rostos queimados,
um bolso vazio de amor,...

concebemos uma solução,
o que passe por equilibrar
uma notícia,
e uma morte,...

assim esperamos da manhã
uma vontade,
da tarde a ilusão,
e da noite o que vier,...

as pessoas anónimas,
o que somos,
os que aceitam
o que de pior,
o real tem


Arte de Bill Crisafi

2024/03/09

...talvez um beijo

pequena,
sincera,
devota,
uma pessoa sem rebordos,....

está vento,
admiro-te pela
inteligência,
para ti números
são corpos,
que importa desbravar,...

e o silêncio,
as noites perdidas algures,
são para pensar,
descredibilizar o ser,....

uma pessoa analítica,
e pensa-se tanto quando
tudo é sensorial,....

talvez um beijo,
perceba esta
conversa sem palavras

                                                                             Tirado daqui

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