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2025/06/03

Sentia até algum asco,...

 Dizia só sons animalescos,

Emitia-os alias,

Sobre as crónicas televisivas,

Principalmente as antigas de Mário Castrim,...


Não podia ter opinião sobre um fenómeno que recusava,

Sentia até algum asco,

E a luz esclarecia algumas dúvidas,...


E a verdade é que o tranquilizava pensar sobre algo que não conhecia,

Sentado por entre os alvores da manhã traduzidos pelos velhos cortinados da sala daquele 1.o andar de Lisboa,...


E não pensava assim tanto em linguagens inalcançáveis,

Mas sim que tinha de se atualizar sobre o que quer que fosse que aquele aparelho deitava,....

Já era tempo disso

                                                                             Tirado daqui

Arte de Lorenzo Mattotti

2025/04/25

E também estar nu,...

 Estou sozinho. Defini estar sozinho como ter deixado de saber escrever. E haver uma manta de lã, talvez demasiado quente para a brisa de fim de dia que se ia avizinhando. E também estar nu. Sim, sentir-me como a única pessoa sem pele do mundo, que caminha pelos intervalos do tempo como se as reviravoltas do desejo fossem fáceis de explicar. E estou sozinho porque também é o que está na página, na última página que quase acabei de ler, quando a linguagem verbal se me tornou completamente estranha. E também porque como sempre tudo o que não devo. Lembro-me de quando ela, ela a que partiu e levou o meu coração, ainda estava deste lado da existência, me dizia que a água devia dormir comigo à noite. E eu Lembro-me de que sempre humedecia os lábios antes de falar, ser inconveniente, quando comia, me tornava estranho a mim mesmo. Só me tolerava com os lábios humedecidos. Porque ela assim me tinha sempre recomendado. E eu agora estava sozinho. Sem saber o que fazer

Nastassja Kinski em Paris, Texas
(1984) 
De: Wim Wenders

2025/02/03

Na lama

supunha saber o contorno
dos olhos,
a virtude de um adeus
dito por eles,...

julgava a prova
de candura,
do toque de quem
nem conhecia,....

lia por cima de
mãos,
de gestos,
de passos
para fora de um círculo de rotina,...

era a ele
que interessava a mentira,
como nota de rodapé
de uma lista de desejos,...

procurava assimilar
o vento que,
passado pelo tempo
das escolhas mal feitas,
o deixava assimilado
na terra do presente,
que o passado soube construir

                                Tirado daqui

2024/12/28

Era lá que gostava de andar

 O desesperado da sala,

Quem se arrastava sempre entre os solsticios do tempo,

À espera não sei de quê e do que viesse por bem,

Anunciava que estava um pouco acima dos pássaros,...


Era lá que gostava de andar,

Onde as encostas das montanhas são cor de desejo,

E o valor dos sonhos descia vertiginosamente até ao real das pessoas,....


E era por isso um senhor à frente dos desesperos da vida,

Estava bem assim e nada nunca o iria fazer mudar

                                                                                 Tirado daqui

2024/12/15

sou eu mesmo do que já fui do que quero ser

 já nada direi,
desfilam-me verões
passados nos rebordos
dos olhos marejados,
com memórias inofensivas
de um mal que nem
conseguia existir,....

sou eu mesmo do que
já fui do que quero ser,
sempre incoerente,
com coletes rasgados de pele,
a cobrir um corpo com
cheiro de terra molhada,....

reconheço que a voz sumiu,
mas a presença é de
um barco,
resistente
à frase destruidora do mar

                                                                                  Tirado daqui
Before Sunrise (1995)
De. Richard Kinklater

2024/11/27

...das tripas coração


                                                                                     Tirado daqui

somos o vento,
e depois crescemos,
de um fumo branco,
envelhecido,
retiramos a presença tranquila
de hoje,
a forma como envelhecemos,
e dizemos olá a sorrir,
quando o choro é a nossa pele
que cavalga sem controlo,....

e a calma surge
com um beijo,
não há presença do
medo,
nem livros deslizantes
de capa translúcida,....

é nosso este
momento para nos conhecermos,
que surge quando
nos espera apenas a noite

2024/11/25

que seja de encarnado

 outra vez de vermelho,
encarnado,
seja o que for,
não me permite
a escrita somada a que me habituei,....

não há saída possível,
seremos dois em breve,
mas por enquanto,
prefiro não ser adicionado,
sou eu,
e a luzidia presença
metálica de um transistor,
com o som repetitivo
e de estertor desconhecido,....

vejo sangue
porque terá de ser,
as imposições têm sempre de ser,
sento-me como o involuntário,
admirador parado do indesejado,....

e pronto,
que seja de encarnado,
não quero saber de mais nada

                                                                       Tirado daqui

2024/08/11

Desnudado

 Há algum tempo que se Conformava,

E confirmava ao mesmo tempo,

Com esta realidade de que o tempo nunca caminha ao mesmo tempo,

Que a percepção que temos do mesmo,...


Ter um corpo deformado,

Iludido,

Empoeirado pelos desgostos,

Não significa que nos avaliemos assim,...


Quer dizer que ao longo deste percurso,

Desnudado,

A que chamamos vida,

Cometemos erros,...


Não falámos quando era necessário,

Fomos por assim dizer abalroados pela conveniência,...


E agora,

Sugestionados pelo medo,

Temos de viver com a reação que escolhemos,

Ao conformismo 

                                                                             Tirado daqui

2024/08/06

As vozes esmorecidas

 O escutador profissional,

O homem que guarda as pedras no sítio certo,

E ouve música para trabalhar mas exige um silêncio seletivo para o descanso,

Excedeu-se em mesuras naquela noite,...


A presente e esclarecida missiva,

Procurou encontrá-lo de bons espíritos,

Capaz de uma conversa que levasse a algum sitio,...


E a princípio acreditou-se ser possível,

Mas depressa o escutador profissional,...


Começou a justificar o seu desígnio,

E embrulhou-se numa dança estranha com as suas próprias vozes,...


A ponto de a secura,

As vozes esmorecidas,

E o desejo de silêncio,

Serem o que restou deste final de tarde,

Num desafio de racionalidade que,

A compreensão não deixará para a história 

                                                                                 Tirado daqui

Who I am no longer matters, 

Tye Martinez

2024/07/10

Chorei-as

 Parece que as chorei,

As lágrimas que eu afastava como o prato meio cheio de comida,

Em dia de discussão,...


Chorei-as,

Assumo,

O meu corpo escorre coisas sólidas,

Como o tempo,

A nobreza,

A loucura,...


E agora que a mim venha a paz,

E a notícia de um mundo desacordado

                                                                             Tirado daqui

2024/05/30

....quem se some

 A calma mede-se com inspirações, expirações. E há um chá que arrefece, pausadamente, com um serpenteio que se ergue na penumbra onde escolhemos estar. Um livro abre-se, com a força do vento de entardecer que surge pela janela entreaberta. Não pedi para estar só. Apenas aconteceu. Tal como os olhos só me doem se eu quiser. Ninguém me manda chorar. Choro porque quero, ou melhor porque não consigo evitar. E, lá longe, sei que quem se lembra de mim sabe isto. Neste momento olho para uma parede. É branca, cheia de irregularidades, manchas progressivamente escurecidas que se calhar sempre aqui estiveram. Tenho de ir a algum lado. Não necessariamente porque preciso. Mas porque tem de ser. Só que por enquanto estou melhor aqui. As mãos doem-me. O peito aperta-me como se não gostasse de mim, e quisesse prová-lo de dentro para fora. Tenho de sair daqui. A porta está trancada. Alguém me quer assim. Insignificante, escondido de tudo. Volto para o canto irregular de uma divisão escurecida. O coração que sinto não é meu. Quer saltar de dentro de um corpo que me escapa. 

                                                                       Tirado daqui

2024/04/17

Vilipendiei

 

                                                                             Tirado daqui

depois de dizer,
desdisse,
contrapus,
vendi ao sol restos
de água gelada,...

enganei,
vilipendiei,
guardei em gavetas
o perfume da tua gola,
os restos esfarelados,
da pele que me seduziu,
e que escapou quando saíste,...

depois de dizer,
relevei,
perdoei,
encafuei-me numa
cama,
senti o sol
viralizado,
e como mentira,
esperei o sono,
a olhar pra luz,
entediado

2024/03/15

Um dia o mundo acaba em declive


Contos do Congo, Mbomo
República do Congo, 
Fotografia de Pieter Henket, 
2018. 

o ar,
a terra sem pássaros,
árvores de morte
espalhadas sem critério,...

 um caminhar pesado,
que se arrasta,
o mundo acaba em declive,
e o homem sorri,...

 desenha no ar as ideias
fortes de uma vida,
e o chapéu,
e a roupa que quer,....

chove,
a carne consome-se
em dor,
e o homem mantém-se,
erguido,
enquanto lê
o que o planeta escreve,
em fogo

2024/02/02

...mãos forjadas na ferrugem

 


O passo entristece-nos,

A maioria do sol esconde-se na pele,

E há um poema inocente,

Sem que o amor o matize de pecado,

A despontar razoável,

Inofensivo,...


A luta não conta,

Ja que o mundo não a quer,

E assim afastam-nos,

Obrigados,

Desalojados,

Até de mãos forjadas na ferrugem 

2024/01/30

A forma negava

 


Vendia o que fosse preciso,

Tinha o suficiente para perceber que estava a mais,

Uma flor,

As unhas quebradiças,

Comer mais do que a vontade exigia,...


Não havia mais,

O amor ponderava,

Decidia,

E ele ia vendendo,...


A forma negava,

O que o conteúdo ia insistindo em procurar 

2023/12/12

...ser andrajoso e sem nome

 


E mesmo por aí. A largueza. Os desafios que um assobio do topo da rua representava. Eram duas e picos,
e como eu gostava de dizer as horas assim!! O dia tinha-se espreguiçado para mim. Ultimamente, punha os pés na rua sempre da mesma forma. À larga. Independente de pressões. Com roupa velha, rasgada. Um par de ténis de Xadrez, que foram de alguém que já não cabe na minha memória. A passada larga, tremida, levava-me a sítios diferentes em cada dia que passava. Era o desnorteado, desorientado, pessoa sem destino, que assustava pelo cheiro, cativava pelas ideias. Um dia inocentei um assassino. Expliquei-lhe que a culpa que sentia, ao chorar desalmadamente junto de um homem a quem o sangue brotava, em golfadas, do peito, era sempre relativa. Se havia uma faca, teria havido uma provocação. Se havia arrependimento, o mesmo cabe sempre no bolso de trás de quaisquer calças. E seguia caminho, inocente para mim mesmo. Culpado aos olhos dos que me viam escapar, impunemente. Sem me querer apresentar, sou fruto das minhas próprias circunstâncias. Fui filho da aventura e do queixume. Nasci presente, e cresci passado. O meu tempo cabe agora nas ruas onde me esconde. Nos becos da náusea, do vómito. E quando regresso ao meu espaço, onde me escondo talvez, de mim próprio, não há nada que caiba na inexistência do meu sorriso. E mais não escrevo. O sol já se põe, esquadrinhado pelos intervalos da prisão de casas que me tem, por enquanto, alma desorientada e sem idade….


2023/11/12

Submeter-me

 


se terminar,
as palavras seduzir-me-ão,
haverá luz suficiente para novos dias,
novas folhas descontroladas de
razão,....

a verdade virá em colheres
de prata,
sons dourados,
velas tremeluzentes que morrem
com elas próprias,...

 se teminar,
a virtude será minha,
e uma passagem da Bíblia,
Novo Testamento,
porá termo ao tempo conforme o conhecemos

2023/10/31

Aperto de mão firme

 


Ele entrou então na sala,

O senhor do seu destino,

Das suas escolhas,

Escolheu ao acaso quem cumprimentar,

E calhou ser um perfeito anónimo,

Sem qualquer elemento identificador específico,

Um total desconhecido,...


Usou o que usava para se afirmar,

Aperto de mão firme,

Polegar a sentir os ossos frágeis do homem que nunca vira,

Mas com a defesa de não trocar olhares artificiais,...


Seguiu depois caminho para repetir o processo,

Com quem calhasse e de forma aleatória 

2023/10/14

Peito aberto à dor



 Adoraria excluir-me totalmente,

Deixar de fora tanto porém,

E razões dissociadas do prazer e da banalidade,

Associar-me a um outro tempo,

A uma nova forma de sentir o passar dos dias,

Em que a dor se jogasse por baixo das mesas,...


E só se calhar houvesse lamentos indolores para o falhanço,

Só assim se partia com vontade para a poesia,

De peito aberto à dor

2023/07/26

....sem o espaço e o medo

 


há cinco anos.
o tempo passou desviado
da sua intuição,
do alimento que a chuva
lhe dava,
fecundando a Terra
de forma,
apesar de tudo estéril,...

passaram-se evidências,
um carro a circular pachorrento
ao nascer do dia,
a voracidade das agressões sem dono,...

passaram-se poemas de
verdade neutra,
sem paternidade reconhecida,...

passou-se a luz no breu
do silêncio,
até hoje,
em que o tempo
recomeça sem o espaço e o medo