Depois das obrigações e do trabalho
a noite consente a ilusão. Agoraqueria sair, ser destemido como Marlowe,
entrar num bar, desfrutar da beleza
das mulheres fatais,
gozar o prazer do fumo de múltiplos cigarros,
quem sabe arriscar e, por uma noite
– bem podia ser esta noite –, ter a sorte do meu lado
no póquer incerto das horas tardias. Só depois
regressaria a casa, exausto
mas feliz por me saber perfumado
pelo assombro profundo, maravilhoso, decadente
da madrugada. Decido
porém ficar à secretária, acender
a luz baixa do abat-jour, ler algumas páginas
de Chandler e escrever nas margens
estas palavras – pedras lançadas à água,
círculos que se expandem – cujo mérito principal
é o de mostrar, uma vez mais,
como eu não soube, ou não quis, escolher
viver a minha vida.
Luís Filipe Parrado
Roma não perdoa a traidores
Língua morta
2021
" pedras lançadas à água,
ResponderEliminarcírculos que se expandem"
Gostei, também, da escrita!
Obrigado
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