2025/02/28

Já não cabe em bolsos rasgados,...

 E dias,e homens de mais a fugir,

O que penso e chamo a mim mesmo nestes dias de cores adormecidas,

Já não cabe em palmas de mãos,

Já não cabe em bolsos rasgados,

Já não cabe se ainda respirar como um moribundo,

Igual às madrugadas em que sonho com o inverso de mim,....


Não há dias de cores feitas,

E por muito que sonhe,

Não caibo mais nas tuas hesitações,

Nem que pugne por odores novos,

Desejos de rua,

Nem que as minhas lutas sejam as de todos,

Não dá mais,

Não estarei mais com rodeios,...


Estou derrotado,

E há partes em que nem entendo o linguajar das derrotas dos dias

                                                                               Tirado daqui

Bernard Plossu 

“Shane” (Foto)

2025/02/27

E as ideias dormiram no meu corpo...

 Depois de ti, 

as palavras foram sujidade,

Passos irregulares de animais sem destino,...


Limpei-me,

Limpei a ideia de nós com lágrimas,

E ficou só o movimento inconsequente de um corpo sem retorno,....


Falar deixou de ser para mim,

O silêncio chamou-me casa,

E as ideias dormiram no meu corpo como larvas de decomposição,....


Não é um cenário irreal,

É o que vivo e lamento a cada segundo que passa,

Mas a esperança ainda quer dar-me a mão,

Quando abro os olhos em cada noite sem nome,

É um sorriso de criança como o dela que vejo,

E está bem assim,....


Até pelo menos me sentir outro,

Livre do teu descer de escadas das madrugadas 

                                                                               Tirado daqui

2025/02/26

...Uma ideia de amores perdidos


                                                                               Tirado daqui

De: Philomena Famulok


E isso não funciona,

Inconcebível uma ideia de amores perdidos,...


Algures num castelo tabelado por uma névoa persistente,

E dois pontos de exclamação,

Frases que nunca irão complementar-se,

Perdidas por um caminho abaixo,....


Não se escreve assim,

Há um dia antes de haver esta noite a que cheira uma história amorfa,

E há corações,...


Talvez de uma geração atrás,

Em que os silêncios se pesavam de outra forma,

E a roupa não contava,....


Por aí fora,

Só razões para que penses noutro capítulo,...


E da poesia sem destino,

Surja uma história alfinetada,

Se bem te lembras,

É assim que chamo à madrugada com inicio em redor de uma prenda,

Mas que se desconhece


2025/02/25

As papas de aveia

 As papas de aveia estavam mal feitas. Ela olhava, cabeça amparada na palma da mão, para os grumos disformes que boiavam no leite. E pensava em férias. Via-se a caminhar na sua praia de eleição, aquela que nunca teve nome pois nunca saiu do cantinho oculto do seu cortex. Estava sozinha, porque os pensamentos agradáveis começavam sempre assim, antes de caminhar para mais qualquer coisa. Só que os malditos grumos das papas de aveia não se desfaziam. Levantou a cabeça a ver se alguém a podia ir ajudar, mas ouvia a sua própria respiração naquele canto esquecido do café. Parou de comer por momentos, deitou mão à mala, e tirou o caderninho de apontamentos. Capa preta, pequeno, com uma fita que se desfazia a marcar as páginas. Andava a poupá-lo porque se tinha afeiçoado. A caneta da bic saltou do recanto onde andava sempre escondida, e com ela desenhou. Primeiro um sol azulado, tímido, por trás de nuvens que na sua cabeça pareciam começar a ser de inicio de Verão. Depois o horizonte, com uma linha irregular de oceano. Depois inúmeros rabiscos, supostamente os anónimos que caminhavam numa praia. E por fim ela. A figura maior, central, das produções ocasionais que tinha no seu caderno de apontamentos. A mulher sem cara, e sem cura aparente, que normalmente era colocada em contextos de ócio. Tinha algum jeito para se manifestar em arte. Nada de excepcional. Entretanto chega o empregado. Queixa-se das papas de aveia. Pede outro prato para o pequeno almoço. Talvez precise da ementa para escolher. 

                                                                                      Tirado daqui

De: Owen Gent

2025/02/24

E não escaparei sem me ferir

 quando eu tenho tempo para ver, as coisas não acontecem. As mãos de hoje, de sempre, recolhem-se, e o silêncio emudece os que até aqui enchiam de vocábulos canoros o passar repetitivo de tempo.
 Abro os olhos, e a mesma ladaínha de sempre, dos velhos, dos que sabem e praticam o saber de experiência feito, brilha timidamente nas paredes da viela em que o meu pensamento está preso.
E cá me prendo, atado de mãos e espírito.
Cá me prendo.

E não escaparei sem me ferir

                                                                              Tirado daqui

Marcello Mastroianni no cenário de filmagens de8 ½, de Federico Fellini

2025/02/23

Puxar por memórias que deviam estar esvaziadas

 Não sabia se a caminhar,

Os pés pesavam menos que a intenção de fuga,...


Se o corpo ajudaria o tempo a impulsionar-me,

Não sabia nada e com a ignorância,

Com o lado apoiado do desligamento sensorial,

Vem a alienação,....


Puxar por memórias que deviam estar esvaziadas,

E isso tudo era suficiente para não me conhecer,

E olhar para caras que os meus olhos já tinham contactado,

Como se fosse a primeira vez

                            Tirado daqui

Blasfémia, por Eliran Kantor

2025/02/22

Escrito de uma penada hoje, ao acordar....

 


Ele começou a escrever um conto. Esta era uma forma vulgar de começar. Mas era a realidade. O homem assumia a pose corporal, o desejo de criar algo de novo. E até o isolamento. Fechou-se em casa, com a porta trancada, e as janelas de forma a protegê-lo da postura assassina do sol de Verão.  E deixou a caneta caminhar. Sim, era um loboantunesiano, contra qualquer tipo de tecnologia ou apoio extra à criação anatómica humana. Feito o enquadramento, interessa tentar perceber quais seriam as suas intenções.  Nenhumas em especial. Primeiro criar um personagem principal coerente. Seria do género feminino. Uma mulher dependente, isolada, que não gostava de si mesma, e só com dificuldade aceitava os outros e as suas diferenças. Mas o contexto em que a faria mover, uma cidade média, com um bulício crescente, que dependia do turismo, e tinha um clima instável, mas cativante, iriam trazer-lhe a inevitabilidade de um início de relação. Essa era ainda a sua dúvida.  Com quem? Tinha pensado, necessariamente, com alguém diametralmente oposto.  De fora, com toda a certeza. Um homem jovem, que tinha partido à descoberta de tudo e de si mesmo. Iria cruzar-se com ela dentro da mais completa casualidade.  Num entardecer, com ela a regressar a casa após mais um dia de trabalho numa ocupação anónima e que detestava. Isso não a iria deixar recetiva a conhecer pessoas novas. Mas ele, pessoa experimentada em contornar as resistências dos outros, talvez apostasse no elogio simples. Da roupa, de algum pormenor imperceptível do aspeto físico. A caneta não conseguia parar, e isso deixava-o agradado. Estava a pensar em posicionar ambos num pequeno parque publico, que existia paredes meias com a casa dela. Ambos iriam a entrar no espaço, já que o caminho para casa a isso a obrigava. Iam dispensar olhares fugidios de início. E quando o leitor começasse a acreditar que nada iria acontecer, com os dois personagens a contornarem-se e a seguir caminho, a iniciativa seria dele. Voltava-se para trás. Perguntava as horas. Ela fingia-se despercebida. Ele insistia, dizendo estar atrasado para um encontro com familiares. Ela respondia, e continuava a andar. Ele invertia o sentido do seu percurso, ela continuaria a fingir-se despercebida. Até que aceitava parar. Iria dedicar-lhe um olhar desajeitado, o único que sempre tinha conseguido fazer. E ele responderia com um sorriso. Tímido a princípio, depois em crescendo.

O escritor teria agora de parar. A inspiração pedia-lhe uma pausa de conveniência....

As coisas de somenos...


                                                                               Tirado daqui

Foi por isso que ao descer a rua,
Percebi que tinha deixado de confiar em mim,...

As árvores pesavam mais que o ar,
A chuva falava-me desordenadamente ao ouvido,
E não sobravam aqueles espaços desnecessários,
As coisas de somenos que guardamos nos bolsos como recursos,
De finalidades diferentes,....

E que naquele momento simplesmente não existiam,....

Mesmo assim fiz o meu caminho,
Inseguro,
Com dores indolentes no corpo,
E cheguei onde tinha de ir,....

Aconselhar-me com o mesmo pôr do sol de toda a vida

2025/02/21

Logo mais

 Os teus cabelos não aconteceram,

Foram a ilusão fantasmagórica daqueles beijos que nos acordam petrificados,...


O teu corpo está desenhado a tracejado irregular,

Fazes uma presença de fim dos tempos,

Assustada ,...


E admiro-te com a ignorância tosca dos homens irracionais,

Que dançavam com a própria sombra,

No escuro de grutas perdidas,.. 


Não sou o vento que assim pensas,

Nem a parte vetusta de um livro,...


Estou sem estar para a tua curiosidade,

E só para o fim dessa tua latitude,...


Nada mais específico,

Conseguirás de mim


Filme: Anatomia de uma queda (2023)

2025/02/20

Elderly woman behind the counter in a small town



A escrita tornava-se soez,
Insultuosa até,
Cheia de personagens esvaziadas pelo passar do tempo,
E de olhares amolecidos,
Vencidas portanto,....

Ela esforçava-se por mudar,
Queria realizações pessoais a curto prazo,
E para isso tentava a estratégia do reverso,....

Pôr a tocar música,
Aqueles americanos que falavam numa mulher que envelhecia,
E que se reencontrava com memórias que partilhara com um fantasma,....

E de repente tudo 
pareceu fluir melhor 

2025/02/19

...soarão a coro


                                                
                                 Tirado daqui

Não consigo explicar,
 Mas sei que será uma novidade,
Vai chegar daqui a pouco,
E o ruído vai atenuar-se,
Haverá diferenças na tonalidade da luz que vem do exterior,... 

Parece-me que a tua cama será maior,
O teu corpo mais adulto,
Menos inseguro,...

E as vozes ocultas dos que partiram soarão a coro,
Um envolvimento de Igreja,
Que nos deixará ansiosos,
Mas felizes,....

Será uma novidade,
E acredito que a juventude vai voltar com roupas diferentes,
E um nome menos impositivo

2025/02/18

...sons sobrantes da noite

 Sou um resto de café queimado,

O dia ainda hesita em espraiar-se,

E já ouço os sons sobrantes da noite,

Com os olhos confortados ao escuro,...


A voz é o que sobra da loucura que não consigo descrever,

E se todos que escrevem conseguem passar por isto,

A mim o tempo esmaga-me nesta prisão de ansiedade,...


Penso em vozes mudas,

Gritos sem corpo,

E corpos sem propensão destrutiva ,... 


E o dia que não quer nascer,

Preso no alto da minha espera assexuada

                                                                             Tirado daqui

2025/02/17

E os homens que reprimem,..

 Só encolher os ombros não chegava,

Eles aceitaram que a sua origem fosse diferente,

E não parecesse final de noite nas suas respostas incompletas e hesitantes,....


Ele teria de ter cabelo de líder,

As pessoas conseguiriam chamar o sol através dos seus gestos,...


E os homens que reprimem,

Com longos casacos negros e olhares vazios,

Nada poderiam contra ele porque a sorte estaria tanto nos seus silêncios,

Como nos passos largos de autoridade que conseguia demonstrar,....


Era a pessoa certa,

No dealbar de tempos novos,

Como esta chuva multicolor,

Refletida pela madrugada,

Parecia indiciar


                                                                           Tirado daqui

2025/02/16

O som ecoa no mercado da carne,...

 Não me faças perder a resposta,

O som ecoa no mercado da carne,

Onde os desesperados sem nome,

Os seres de idade desesperadamente falhada,

Palmilham sem destino,....


Há voz que ainda se ouve,

Factos sem perdão,

Uma história que não entendes,...


E por isso quase perco a resposta que queres,

O refúgio é a cidade ao entardecer,

Terás de me encontrar,

Para que o lamento que procuras,

Ganhe corpo e até a possibilidade de um beijo

                                                                          Tirado daqui

Claude CaroneListen Carefully, 2021

2025/02/15

Um entrelaçar de dedos lento...

 Mostravam compromisso,

Um entrelaçar de dedos lento mas intenso,

Corpos que se aproximavam lentamente mas com a fidelidade provisória possível,...


E o olhar,

O olhar preso na rebentação daquele mar de estanho,

Refletido de forma violenta e breve num céu arreganhado de inverno,

Prestes a desabar com a imprevisibilidade que se esperava,....


Mas os dois estavam imóveis,

Apertando a espera em corpos apesar de tudo tranquilos,

Porque contavam um com o outro 


                                                                              Tirado daqui

Pablo Picasso
Pai Natal
de 1959

2025/02/14

...sombras de memória

 Hoje sonho outra vez com as minhas sombras de memória,

O que chamo às especificidades de uma vida de insegurança como tem sido a minha,...


Figuras que se deitam comigo nas noites,

Sobem pelo corpo num frémito indolente,

E tornam-me um poço de ansiedade sem expectativa e sem tempo,...


Não me culpo por carregar espécies de fantasmas assim,

Aconteceu,

Como a respiração é diferente de pessoa para pessoa,

E o olhar tem os seus pontos de fusão a diferentes distâncias



                           Tirado daqui

2025/02/13

Já não é uma questão de medo,. ..

 Entre a pressão e o desejo,

Vitórias seguidas sem roupa no encalço do que vou deixando,

Por entre o rasto da chuva,....


Já não é uma questão de medo,

Nem de querer resolver pela concórdia a vontade de matar alguém,...


É o barulho que a noite deixa ao descalçar-se,

É ninguém entender o que partilho,

O que retiro ao noves fora nada dos equivocos que deixo para trás,...


Se sou o meio da noite,

E tudo isto não cabe no vestido virginal da madrugada,...


Então desisto,

Lido e relido,

 sou só a porção menor de um plano azulado de 

cinema empobrecido

                         Tirado daqui

2025/02/12

A história reescreveu-se,...

 Não contente com os sofrimentos reais,

A história reescreveu-se,

Arrastou-se numa hesitação sem contexto,

E trouxe vagas sucessivas de líderes sem nome,....


Respirações ofegantes e braços recolhidos em público,

Que insistiam no anonimato como retorno da confiança no povo que se assumia,...


E era nos livros,

Da forma como sempre se geraram as ruturas,

Que o real se colava a si mesmo,

E prosseguia,

Como um réptil que

 perdia partes do corpo

                             Tirado daqui

2025/02/11

As palavras que guardo,...

 As palavras são minhas,

O silêncio das vezes precisas que o mar falhou a costa,

E trouxe quase o parar das formas geométricas do amor,....


As palavras que guardo,

Olhos adormecidos a condizer,

Vocábulos com partes espalhadas pelas partes do mundo,

 onde a noite se enamora do dia,....


E há interesse,

Quem me ouve sente o tempo como acalmia do desejo,

Um calor no rosto gelado,

E a fruição de uma refeição de alimentos sem cor,... 


Tomo-me assim como o detentor do som articulado,

E sei-me melhor,

Tão melhor que a versão despida dos meus passos de ontem

                            Tirado daqui

2025/02/10

...um impasse sem descrição

 Não ter o que fazer,

Lamentar,

A frase,

Até a palavra insuficiente,

Guardada no bolso com cuidado,...


Tudo é irracional ao ponto da loucura,

Com vontade lunar de que um beijo,

Apenas um beijo,....


Ajude a resolver um impasse sem descrição,

E que pressione a vontade ao ponto do desespero anormal,

E corriqueiro

                                                                           Tirado daqui

2025/02/09

era um culto instituido

todos os planos foram infrutíferos,
as pessoas caminhavam
sem destino,
e as recomendações de pouco
lhes serviam,...

era um campo plano,
sem escapatórias,
e o medo corria sem contenção,.....

falou-se de estátuas,
reais ou imaginárias,
que seriam um abrigo possível,
mas desvaneciam-se,
e cheirava a cultos de outros tempos,....

invocações de deuses
que o céu,
escurecido
em tom de estanho,
parecia querer revelar,....

era um culto instituído,
e os que pensaram de forma diferente,
falharam

                            Tirado daqui

2025/02/08

E tudo se tornou menos impreciso,...

 Ao acordar o medo deu-me esperança,

A presença de um dia mais pequeno que a noite,

E o cheiro cheio da expectativa,

O que ela deixa nos espaços ansiosos de um corpo abandonado,

Fez-me hesitar,

Mas desbloqueou tanta coisa inocente,....


Escrevi palavras que já não reconhecia,

Os segundos que se seguiram tornaram-se perfumados,

e com desenhos explícitos de sonhos,....


E tudo se tornou menos impreciso,

Mais fácil de assimilar dentro de uma finitude que a cada dia me abraçava,

Com mais e mais força,

Numa valsa afunilada de recordações assoberbantes

                             Tirado daqui

2025/02/07

Acabou-se

 acabaram-se talvez as palavras,
os momentos de metal gravados,
na paupérrima desilusão
de uma fuga,...

acabou-se dizer
da noite o dia,
e do dia a vontade de perder,...

acabou-se a cama vazia,
os lençóis esvaziantes
em sons assustadores de vento de Inverno,...

entro porque tem de ser,
e saio porque a razão
ainda é precária,...

acabou-se a pressão
de ter uma praia para nós,
acabou-se

                                                                          Tirado daqui

Trois couleurs: Blanc, Krzysztof Kieślowski, 1994

2025/02/06

Os dois homens levantam-se,...

 Uma bandeira dobrada em quatro,

Dois desiludidos que a observam em silêncio,

Com olhares cheios de compromisso e poses corporais anuladas,....


Um cheiro a passado no ar,

Com veleidades revolucionárias e uma música quase muda,

Mas ainda assim insinuante que se esgueira no ar,....


Sabe-se que o tempo não pára,

Mas aquele é o momento de como as coisas já foram,

Com o presente em paragem quântica,...


Os dois homens levantam-se,

E saem

                                                                             Tirado daqui

De. Philomena Famulok

2025/02/05

...deitar-me com a psicanálise

 É igual para mim,

A sombra encopada com uma mistura de café,

O dia a pedir-me desculpa,

Tanto me faz,....


A ideia é evitar que limpem o chão comigo,

E me digam que as formas inocentes com que acordo,

São memórias de uma infância que eu próprio travei,....


Sei que devia deitar-me com a psicanálise,

E acordar outro e para outros,

Mas não consigo,....


Ainda não é amanhã,

E penso já ter-me apercebido disso 

                            Tirado daqui

Arte de Yudho

2025/02/04

Doses certas de sopa,...

 Não te prometo a verdade,

Doses certas de sopa,

Ou sequer água pela manhã,....


O abandono é uma certeza,

Se e quando as escolhas são apenas erradas,

E os meus passos desenham-se consoante o prazer que resta,

O refúgio que ainda vou encontrando em páginas livrescas de magia,...


Por isso não contes com a verdade,

Só com o nascer hesitante de cada dia,

E a lealdade inofensiva de beijos entristecidos

De: Patricia O'Maille

2025/02/03

Na lama

supunha saber o contorno
dos olhos,
a virtude de um adeus
dito por eles,...

julgava a prova
de candura,
do toque de quem
nem conhecia,....

lia por cima de
mãos,
de gestos,
de passos
para fora de um círculo de rotina,...

era a ele
que interessava a mentira,
como nota de rodapé
de uma lista de desejos,...

procurava assimilar
o vento que,
passado pelo tempo
das escolhas mal feitas,
o deixava assimilado
na terra do presente,
que o passado soube construir

                                Tirado daqui

2025/02/02

Som esquálido


                                                                                 Tirado daqui

Quem lhe afaga o dorso,
Quem escolhe as palavras de prata,
Que obscurecem a lua de papel que a adormece a cada noite,... 

Somos os mesmos,
As prováveis causas da evaporação do racional,
Os que se cimentam com a razão à porta de cada jardim do adeus,....

Haverá letras grandes nos passos de silêncio com que nos afastamos,
Som esquálido,
Predação pura na forma como ela chora nas nossas mãos,
E depois restabelece a paz venturosa com que encena cada regresso,...

E é vosso cada momento em que os olhos dela marcam o ritmo,
Da forma gratuita como o mundo lhe baloiça entre os pés,...

E saber que ela nem sequer é real,
Para os que comem a luz ao acreditar que sim

2025/02/01

Fevereirando a 29 de Setembro

 Sentia a indecência,

A ofensa pura e dura,
Os dias de desilusão,...

Tanta coisa má e indesejada,
Colada à pele;
como um sol envelhecido,
que nos conduz à desumanização,....

Não conseguia respirar de outra forma,
Trazer virtude às palavras de outra forma que não a da vulgaridade,
Das pressões auto infligidas,....

Era monótono,
Repetitivo,
Mas um sentimento presente,....

E para ela só a releitura do conformismo,
Em livros que fizera por esquecer,
Trazia a vontade de prosseguir

                                                                             Tirado daqui

My black horizon – Olafur Eliasson