2025/02/25

As papas de aveia

 As papas de aveia estavam mal feitas. Ela olhava, cabeça amparada na palma da mão, para os grumos disformes que boiavam no leite. E pensava em férias. Via-se a caminhar na sua praia de eleição, aquela que nunca teve nome pois nunca saiu do cantinho oculto do seu cortex. Estava sozinha, porque os pensamentos agradáveis começavam sempre assim, antes de caminhar para mais qualquer coisa. Só que os malditos grumos das papas de aveia não se desfaziam. Levantou a cabeça a ver se alguém a podia ir ajudar, mas ouvia a sua própria respiração naquele canto esquecido do café. Parou de comer por momentos, deitou mão à mala, e tirou o caderninho de apontamentos. Capa preta, pequeno, com uma fita que se desfazia a marcar as páginas. Andava a poupá-lo porque se tinha afeiçoado. A caneta da bic saltou do recanto onde andava sempre escondida, e com ela desenhou. Primeiro um sol azulado, tímido, por trás de nuvens que na sua cabeça pareciam começar a ser de inicio de Verão. Depois o horizonte, com uma linha irregular de oceano. Depois inúmeros rabiscos, supostamente os anónimos que caminhavam numa praia. E por fim ela. A figura maior, central, das produções ocasionais que tinha no seu caderno de apontamentos. A mulher sem cara, e sem cura aparente, que normalmente era colocada em contextos de ócio. Tinha algum jeito para se manifestar em arte. Nada de excepcional. Entretanto chega o empregado. Queixa-se das papas de aveia. Pede outro prato para o pequeno almoço. Talvez precise da ementa para escolher. 

                                                                                      Tirado daqui

De: Owen Gent

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