2008/03/30

Minotauro

Quem jurou ter visto um Minotauro a correr, absorveu um raio de luz. Fulminante, perfumado, serviu para apagar memórias que com certeza só servirão para furar o crânio, e trazer sofrimento.
Será uma esquina. Mal cheirosa, de mau porte. Será uma esquina onde isto aconteceu, porventura com a ajuda de relinchos atrevidos de um vento perdido em labirintos de tabique apodrecido.
Tímido miar de um gato ostracizado, que assiste a tudo encolhido numa pequena fenda de betão. Aliás, a única que escapa à tristeza comprimida de um cinzento de cimento deprimido. Entristecido.
Abandonada à sorte, uma esquina mal cheirosa que só é incentivada pela menor presença de um lampião de mau porte. Dos tais que já terão servido de escritório a mulheres que, à noite, são almas esguias e eléctricas, e filhas de Deus com uma racha que serve para parir.
Uma intermitente placa de néon abanou. Tremeu as fundações, mas não caiu. Quem jurou ter visto um Minotauro a correr, agora não jura mais nada. Diz-se que terá sido uma mulher pequena. Esquecida, ruborizada. Autómato de felicidade sumida. Evaporada.
Simplesmente ficou o deleite de sentir brisa maximizada, no limite da esquina malcheirosa.
E a chuva faz o seu papel. É recebida com um coro de ais mudos, que ecoam para dentro.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Acha disto que....