Toda a gente dizia que eram irmãos muito diferentes. Afonso gostava de insetos. Vicente nem para um mosquito conseguia olhar. Afonso gostava de amarelo. Vicente era feliz à noite, depois dos pais fecharem a porta do quarto onde ele e o irmão dormiam. Começava a desenhar sopas de estrelas no teto, enquanto do irmão só se via o penacho fora do lençol, com tanto medo que tinha do escuro. Até no vestir os dois não se conseguiam sequer aproximar. Viviam no canto mais frio do país para onde os pais tinham ido viver. Afonso gostava. Era tão feliz, rindo a correr na neve que lhe deixava o cabelo branco, a roupa molhada. Mas não se importava. A sua brincadeira preferida era fazer anjos na neve fofinha. Vicente ficava a ver o irmão correr na rua. Odiava o frio. Andava sempre a sonhar com o verão, e praias a perder de vista, onde pudesse correr, jogar à bola, e divertir-se com o cão da família.
2021/07/30
História com fim abrupto que não chegou a ir a lado nenhum,...mas esteve quase
Um dia, quando estavam sozinhos no quarto, antes de o sono os levar aos dois para a terra dos sonhos, resolveram começar a última conversa que ambos pensavam um dia poder vir a ter. Afonso começou:
-Vicente, estás acordado?
Não teve resposta à primeira, e insistiu.
O irmão respondeu com um resmungo, até que lhe disse:
-o que queres?
Afonso estava a pensar que queria ser mais parecido com o irmão. Enquanto olhava para os números do despertador a passarem, no escuro do quarto, dizia-lhe o que imaginava.
Tinham de os dois pensar numa coisa que deixasse toda a gente impressionada. A acreditar que eles eram os meninos mais criativos do mundo.
E lembrou-se,...
Porque não se tentavam transformar na mais linda flor que o mundo já tinha visto.
Vicente adormecera. O barulho do ressonar mostrava que já estava no mundo dos sonhos. Afonso sentiu um pequeno sorriso a esboçar no rosto, e agarrou-se ao urso de peluche, que tinha um botão em vez de nariz, oferecido pela avó Arlete quando ele era pouco mais do que um bebé.
O dia nasceu. Os dois irmãos fizeram o que faziam todas as manhãs, e saíram juntos para a escola. Enquanto esperavam pelo autocarro que os havia de levar para as aulas, Afonso voltou a tocar no assunto.
"Quero que fiquemos mais juntos. E vamos conseguir"
O autocarro chegou, e os dois irmãos entraram. Não gostavam daquele sítio. A neve caía com flocos grossos, desordenados. Fazia muito frio em todo o lado. O único sítio onde pareciam estar bem era dentro dos lençóis, onde tudo era quente e fazia lembrar casa. Mas tinham-se um ao outro.
Passaram vários dias. Afonso optou por estar calado....
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Etiquetas
'abrir os olhos até ao branco'
(2)
'Depois de almoço'
(9)
'na terra de'
(2)
abstracao
(1)
abstração
(19)
abstrato
(197)
Absurdo
(62)
acomodações do dia
(1)
acrescenta um ponto ao conto
(1)
alegria
(2)
alienação
(1)
amargo
(4)
análise
(1)
animado
(2)
animais
(4)
aniversário
(11)
antigo
(1)
antiguidade
(1)
atualidade
(2)
auto
(1)
auto-conhecimento
(4)
autor
(12)
Blog inatingiveis
(4)
blogue
(10)
breve
(4)
casa
(1)
casal
(1)
coletâneas
(2)
companhia
(1)
conformismo
(3)
conto
(4)
Contos
(61)
corpo
(5)
crónica
(1)
crossover
(4)
cruel
(1)
curtas
(8)
Dedicatória
(22)
Denúncia
(2)
depressão
(6)
dia da mulher
(1)
Dia Mundial da Poesia
(7)
Diálogo
(6)
diamundialdapoesia
(2)
dissertar
(10)
divulgação
(1)
do nada
(5)
doença
(1)
escrita criativa
(1)
escritaautomática
(10)
escritores
(12)
escuridão
(2)
pessoa
(5)
pessoal
(29)
pessoas
(13)
Há irmãos muito diferentes, na verdade.
ResponderEliminarUm belo conto, gostei.
Bom fim de semana, caro Miguel.
Abraço.
Olá Jaime, bom dia.
EliminarIsto foi um principio de conto, com a intenção de ser enviado a um concurso. Mas nunca teve qualidade para isso
:-)
Obrigado pela presença
Vicente ressonava, Afonso não dormia.
ResponderEliminarPormenor bem 'apanhado':-)
Eliminar