2020/12/18

Um dia gostava de saber escrever assim

 

antónio ramos rosa / mas agora…

 
 
Mas agora estou no intervalo em que
toda a sombra é fria e todo o sangue é pobre.
Escrevo para não viver sem espaço,
para que o corpo não morra na sombra fria.
 
Sou a pobreza ilimitada de uma página.
Sou um campo abandonado. A margem
sem respiração.
 
Mas o corpo jamais cessa, o corpo sabe
a ciência certa da navegação no espaço,
o corpo abre-se ao dia, circula no próprio dia,
o corpo pode vencer a fria sombra do dia.
 
Todas as palavras se iluminam
ao lume certo do corpo que se despe,
todas as palavras ficam nuas
na tua sombra ardente.
 
 
antónio ramos rosa
matéria de amor
editorial presença
1985

10 comentários:

  1. E desse escrever que eu gosto, é essa escrita que eu amo e admiro.
    Quando descobrir como se chega lá, diga-me como fez.
    Quero fazer igual!

    Um abraço.

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    1. Suspeito que nunca vou conseguir
      :-)
      Mas pelo menos vou tentando.
      Obrigado pela presença

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    2. Tentar eu também tento, mas fico sempre muito aquém de si e de Ramos Rosa. Essa é a verdade nua e crua. :(

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    3. O segredo, como em tudo na vida, acho que é a prática
      :-)

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  2. Realmente, é muito belo o poema que escolheu! A última estrofe é de grande encantamento. Abraço.

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  3. Não sei se sei escrever assim ou parecido. Gostei muito de ler

    Bom fim de semana

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    1. Eu sei que não sei
      :-)
      Mas não fico triste. Vou tentando.
      Obrigado pela presença, e bom fim de semana

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  4. Grande poeta, grande poema, grande praticante da beleza.

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