2018/06/19

Lá onde tudo faz sentido

Todas estas coisas aconteciam quando ela estava a pisar os vinte e quatro anos. Estava sem ocupação fixa, já que não conseguia sentir as fardas como segundas peles, nem ouvir todos os dias impacientes desmandos de frustrados a escarafuncharem-lhe os ouvidos, como se fossem papa-formigas esfomeados a furarem a terra.
Trocava esses milhões de rotinas que já parecia ter tido, por passeios reconfortantes naquela terra onde agora estava, e da qual preferia não saber o nome. Contentava-se com o vento a pentear-lhe os cabelos, ao mesmo tempo que beijava as paredes de cada prédio com os bons dias sacramentais. Adorava decifrar cada nascer do sol, como se tivesse o enigma primordial no horizonte, escrito no vermelho fogo que só aquela terra parecia ter.
Nunca quis, no meio de todo este afã sensorial, comprometer-se com ninguém. Era filha do acaso, e só conseguia dormir à noite depois de tocar cada ponto cardeal do seu corpo, e sentir que continuava a ter prioridade no festim silencioso que eram as madrugadas consigo própria.

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