já escolhi não escrever
tanto,
o tempo passa,
os momentos anulados,
a felicidade invertida
de um poema,
ter olhos de onde
saem tentáculos,
que fazem inverter
prioridades,
tudo perdeu a emoção
de não ter tempo suficiente,...
a vontade de me remeter
à infelicidade de um gato,
que lambe a glande para
conter a vontade,
talvez resuma tudo
2022/10/31
Infelicidade de um gato
2022/10/30
Esplancnofilia
Dás a volta à cozinha,
E és como uma terra,
Com sabores e loucos próprios,
Segredos que cheiram a refogado,...
E ao abrir o jornal,
Na segunda página está a opinião comum sobre tudo isto,
Ao dissecarmos o problema só faz mal a decisão de espera,
É como uma política de noticia o que sobra de tudo
2022/10/29
História de uma renúncia à teologia
Não é que tivesse alguma coisa a ver com aquele homem do clero,
De trajes largos, andrajosos até,Esforcei-me ao maximo ainda assim por lhe explicar quais eram os meus planos de vida,...
Por sorte haviam sempre grandes jarros de água quando eu queria agir assim,
E me dar talvez força para ser racional,
Sem ser ofensivo,
E foi nessa altura que provei o desdém que consigo ter pelas coisas que se calhar até são sagradas,...
Disse-lhe que encontrara o desejo nas coisas torpes da vida,
Que gostava agora de ler sem ter qualquer preconceito,
Ou racionalidade teológica e que amedrontasse,...
Ele fez jus à história humana,
Deu a outra face,
E reforçou agora uma fé que para mim passara a ser desconhecida
2022/10/28
Calhar
calha-me a sorte,
a pessoa,
a luzidia contrafação do amor,
calha-me a parte do todo,
e a música dos ossos que
estalam à dor,...
calha-me a vitória no
menosprezo da derrota,
calha-me o fim,
apagado com pedras
2022/10/27
Escuridão é uma mulher doente
Os restos de uma noite de compromisso,
Soltos pelo teu cabelo,Como vestigios de um Outono que tarda em desvanecer,
A frase mais certa num momento como este,
Repousa do lado de lá da porta,
Enquanto o silêncio se soma aos minutos que antecedem,
O adeus imprevisível,...
Tudo que entretanto se passar,
Correrá por fora numa pista de despojos,
Que a manhã já prepara na rua,...
E que se façam dois anúncios diferentes de luz,
A escuridão é uma mulher doente que não tardará em partir
2022/10/26
Rio
Há um rio,
Que só sobe,No desejo deste rio cabe
O amor,
E o amor anula-se perante o ódio,...
E do riso da frontalidade,
De crianças velhas toda a vida,
Não se fala neste rio,
Só do desânimo,
Que se esquece
2022/10/25
O mural
A 26 de Maio de 1912 uns poucos de artistas juntaram-se para criar um mural,
Que homenageava a solidão,
Tinha de ter traços grossos e bem distintos dizia um,
A solidão nao se pinta, vamos é embora,
Dizia outro,
O consenso chegou depois de o sol se pôr sobre o rio tejo,...
E a sombra enamorada e velha da lua começar a projetar o vazio sobre as paredes daquelas ruas enxutas,...
E as sobrancelhas daqueles poucos de artistas começaram a fechar-se,
Até que um sono contagiante pegou todos de assalto,
E o melhor mural sobre solidão surgiu invisivel,
Agarrado a todas as casas como sexo indesejado,
Mas inevitável
2022/10/24
Rotinas
Era sempre a mesma forma de estar vivo. Acordar em fila Indiana, ir à janela, desdenhar a liberdade dos pássaros,...
Pôr roupa a tapar a pele,e sair.
O transporte passava atrasado,... Não estava num país sério,... Andava umas paragens enquanto observava as nuvens chorarem para cima das pessoas despreocupada, e saia debaixo da árvore mãe da desilusão.
Caminhava deselangantemente por destinos que fingia não conhecer, enquanto escrevia transparências nas paredes. Faziam-no sentir mais leve que o vento
2022/10/23
Desenhasses a sorte
as casas parecem o equinócio
de qualquer coisa,
só te pedia,
recordo-me,
que desenhasses a sorte com a ponta
dos teus dedos,
e lá ao fundo,
onde se perde a vista deste bairro
de tristezas por explicar,
talvez aí permaneça aquele meu sorriso
de que sempre falas,...
e sem que me digas
o que pensas que ele poderá dizer,
prometo que serão promessas
o que entre nós ficar disto,
que se arrasta pelas ruas
que ambos conhecemos,
e do medo que repartimos por
o que elas representam
2022/10/22
Unhas da distância
quando eu não for a
supremacia,
as vozes mais altas
que nos gritam aos ouvidos,
intimidando o medo
a ficar guardado por trás da
luz,
….,
aí a frase certa virá a lume,
e haverá pedras de fósforo
que se
sobreponham ao fogo,
e tragam assim a qualquer véu,
a escuridão que não se
tapa
com as unhas da distância
2022/10/21
Sorriso
o silêncio não tinha preço,
morava no ricto frugal
do amanhecer,
nas presenças inúteis
de nós em cima da chuva,...
em todo o lado víamo-nos
como páginas inofensivas,
de um livro que recusado
a abrir,
nos fazia saber o suficiente
para mais uma noite em ritmo morno,
de amor
2022/10/20
Nas cozinhas do povo
Como tinha lido em V.I. Lenine,
O lúpen da sociedade esquece-se,
Enquanto os chás fumegam nas cozinhas
do povo,
e o caminho para qualquer coisa de novo
faz-se complicado,
com remessas enormes de tormentos,
ideias falhadas,...
Ensinaram-me que as ideias um dia se calarão,
e não será mais possível avaliar
a frustração de querer mudar,
e se respirar apenas o que poderia ter sido diferente,
sem que a luta o tenha procurado,...
os chás continuam a fumegar,
nas cozinhas do povo
2022/10/19
Obrigado desalinhado
obrigado,
deslizo por entre palavras de
lixo,
desejos infundados,
e propostas anuladas
para uma frontal,
e cabal manifestação de luxúria,...
obrigado por seres quem me impede,
me deseja o suficiente para que haja
sempre uma noite,
após uma refeição bem tomada,
e a música que se desfaz,
no horizonte inquinado
de todos os pecados sem nome,...
Obrigado,
vezes mil, até à exaustão,
e faço-o por cima do teu corpo,
dançando com o teu desejo efeminado
de força,
porque assim se calhar tem de ser
2022/10/18
O resto eu já faço
O resto eu já faço,
Para já só o luar,Cristalizado nesta versão de cidade nova para o meu desejo,
E todas as coisas importantes que um aceno pode trazer,...
O resto eu já faço,
Se mo permitires,
Será melhor que nos passados que conhecemos juntos,
E haverá silêncio de sabores estranhos,
E várias razões para o sexo,
Tão efusivo quanto silencioso,...
E no fim,
Bem,
Cada fim nem sempre é um princípio,
Mas verás,
Quando fizer o resto que falta
2022/10/17
atacadores presos ao chão
expoente máximo
do erro,
da desilusão,
obriga a palavra
a desfilar inocente,
por ruas que nunca
conheceu,...
e por ti espero,
de atacadores presos
ao chão,
com equilíbrio periclitante,...
sabendo que
entretanto há peixe
ainda no rio,
de todos os nossos olhos,
e a carne do abandono
apodrece ao calor
que não pára de aumentar,...
em mim sobrevive o frontispício,
e as possibilidades reais
de erro que uma estátua irregular,
apresenta aos olhos de
quem não sabe
2022/10/16
Primeiras páginas de livros
as primeiras páginas de livros,
se pudesse empilhava
primeiras obras,
coisas de consagração,
ensaios,
fosse o que fosse,
e passaria dias a fio
a perceber como cada autor
põe a andar uma máquina
invisível,
emissora de fumos,
maus cheiros,
desânimos feios,
amores de prenúncio,
até a mesma se imobilizar,
parada ou em andamento,
quilómetros depois,....
como qualquer outra
2022/10/15
Voz revisitada
Ó voz,
Meu astrolábio de mares perdidos e sem mundo que se saiba,Acordaste-me a desenhar círculos impercetiveis no meu ser,
Enquanto avançava indefeso por uma noite que sozinha já nada representa,...
Contigo tenho adoração,
País,morada e idade para me conhecer no desvanecimento do tempo mãe,
E principalmente receio,
Um medo vestido de abandono,
Que me norteia por um caminho onde me dás uma mão maternal
2022/10/14
A desculpa
a desculpa implora
por razão,
despe-se como o Fado,
anula-se como a morte,
sai à rua à mesma hora
que todos os Assuãos
que lamberam o ventre da Terra,
e depois não é nociva,
dói menos que o
imperativo categórico,
espuma loucura,...
e no fim da medida
impulsividade do medo,
é só desculpa,
e o tempo prossegue impávido
2022/10/13
Mais um pouco de raiva
Ela começou a repetir o seu pequeno ritual,
Como se de uma voz em orquestra decadente se tratasse,
Mais um pouco de raiva,
mais um pouco de raiva,...
Versos sem sentido e até desnutridos,
Que tornavam o momento indecoroso para que voltasse a haver perfeição naquele pedaço de mundo assombrado,
Restava-me marcar o compasso com o olhar
2022/10/12
Agressão
acordo com a idade que me apetece ter. Já vivi tanto. Sobre as razões que perdi, e voltei a encontrar, de propósito não me pronuncio. A cobardia fez-me mal, a coragem ainda pior. E com os sustos da inocência, aprendi a construir um casulo de lentidão em redor de tudo o que defendia.E quando tudo parece estar preparado para que não perca mais letras sob a forma de unhas que de mim se desprendem, apodrecidas, os planos mudam.
E não faz bem perceber que tudo são incongruências. Desígnios que custam a realizar. Mas para os quais não há tradução em moedas de sonho.
2022/10/11
Viver duas vezes
Ainda bem que eu vivi duas vezes,
A primeira não gostei,
Passei tempos redondos fechados em mim,
Sem notas de mudança,
Com livros espalhados pelo chão,
E sem vontade de os desvirginar,...
A segunda tem mais a ver comigo,
Viver de facto é diferente,
Há uma mudança efetiva na roda do tempo,
E quase não é necessário fazer nada
2022/10/10
Sonhar e mais alguma coisa
Mas a verdade é que gostava que as letras continuassem a ser desenhos azuis,
Como se dançar num papel desgrenhado seja um destino,
E não uma alegria,...
Gostava que sonhar fosse possivel sem dor,
E a dor doesse menos que ver partir quem se ama,
E que no fim resumir seja o mesmo que criar,
Quando se sonha assim de forma tão sincera
2022/10/09
Passado absorto
2022/10/08
...dos meus olhos ainda pende
Não decidi nada de ti,
Nem por ti,
Nem sobre a imagem de ti que dos meus olhos ainda pende,...
Pensei que havia a luz de um argumento fraco para poder prosseguir,
Assim como se duas mãos fossem suficientes para que nada se sufocasse,...
Sei que não faz sentido,
Nada do que digo nem demonstro,
Mas dá-me a hipótese de um amanhecer que termine o que o vento não conseguiu
2022/10/07
Dança obscura
A idade marcava 60 anos por aí,
Havia alguns sulcos na cara,
O que indiciava mais mas sem certeza,
Lembro-me que dançámos,
Em silêncio ela desenhava-me círculos solares nas costas,
Os eternos símbolos de felicidade,...
Preferiu ocultar-me o peso da alma,
Sussurrando não acreditar nos 23 gramas que a religião atira,
E que o nome também não interessava,
Só a dança
2022/10/06
Acariciava o sexo
Ela assim como ele,
Sentava-se iludida,
E acariciava o sexo como se do agora,
Dependesse a dor que o amanhã sempre
desenha na pele envelhecida,...
E de duas mãos conseguia fazer o que parecia ser uma,
Ele tinha-lhe ensinado essa maldade,
A mesma que o primeiro ser da história
conseguiu que ficasse gravada no tempo
2022/10/05
Nome maior que o acaso
Algures por aqui,
Um sono dificil de descrever,
A volúpia,
A vontade de um desejo encoberto por roupas toscas e fora de época,
Tudo ao abrir de portas,
De par em par,
Como se o tempo recusasse um nome maior que o acaso,...
Tudo explicado,
Espero que entendas que nada melhor que um inicio de ultimo romance de vida,
Te posso oferecer neste tom de silêncio
2022/10/04
O que existo pesa
Não me vejo na possível razão de uma falta,
De um silêncio,
Das duas maiores vezes em que fui amor,
Sobrou o espaço de uma luz,
A envolver dois passarinhos que cruzam os céus até ao desvanecimento,...
E porque não me resto à memória,
O que sou sobra,
O que existo pesa,
E o que se quiser,
Nunca acontecerá
2022/10/03
...último dos fados do desejo ainda vivos
Fizeram as malas,
havia tanto por dizer mas o tempo
inverte as prioridades,
e com as roupas precisas,
os livros das recordações despedaçadas
a ficarem para trás,
e um silêncio que empunhava mordaças invisíveis
a tolher-lhes o som,
partiram,....
havia um mesmo caminho por percorrer,
cheirava a maresia encardida pelas chaminés
de todos os dias,
e das dores mais ocultas da meninice,
que pareciam encorajá-los a
não parar,...
e não pararam,
ao som do último dos fados
do desejo ainda vivos
2022/10/02
Falar
Só me lembro que falámos,
Muito,a toda a hora,
Sem pontuação e trejeitos na voz,
Os minutos escorriam como as gotas de chuva de um dia de Outono,
E foi lindo,...
Selado com um olhar de apreensão,
Acabámos este pacto sem nome,
Mas com fibra histórica de amor
2022/10/01
Outubrando em rosas
Não me lembro,...
Do quê?,...
Se qualquer coisa se segue a esta descida,
E depois a uma curva pronunciada à esquerda,....
Sei que algures está um grande plano dos teus olhos,
Com uma câmara mesmo muito aproximada,
O suficiente para que uma simples dúvida esboroe a confiança em todo este passado que,
Apesar de tudo,
Ainda cheira a rosas,..
Que rosas?,...
As mesmas que te dei quando o mundo se descolou do ovo em que o achávamos,...
E olha,
Agora está aqui,
No meio de nós,..
À espera de se partir